Tarefa inglória


O crescimento do surfe é assunto debatido no mundo. E números impressionam os mais pessimistas. Fala-se em mais de 20 milhões descendo ondas até nos cantos mais distantes do planeta. Com tanta gente praticando o esporte e vivendo dele, estranham as novas regras da ASP, que neste primeiro momento mostra uma face apenas castradora.

Dos 44 surfistas do atual grupo da elite mundial, só 32 primeiros vão continuar na nata após a quinta etapa do mundial, em Teahupoo, no Tahiti. No fim da temporada, descem os 10 piores, sobem 10 do ASP One Ranking, diminuindo sensivelmente o número de participantes do World Title (WT).

Além de mal explicada - até dia desses profissionais pensavam que o ASP One Ranking iria alçar 10 atletas para as etapas do WT pós-Teahupoo -, a nova fórmula é um Frankenstein, feita a partir de um tico de outros formatos, com base maior na do circuito mundial de tênis.

Aí está o erro. Ou se assume um ranking tal e qual acontece na ATP (Associação dos Tenistas Profissionais) ou sair emendando as coisas só ratifica a fase meio perdida da entidade que rege o surfe internacionalmente. No tênis, as competições são divididas por pesos. Têm os Grand Slams, os Masters 1000, os Masters 500 - entre outros torneios -, e assim vão seguindo uma ordem decrescente. Cada uma delas, com premiação, critérios de participação diferentes e pontuação idem.

No final de cada temporada do tênis, há o campeão simbólico do ano, que soma os resultados das últimas 52 semanas de cada atleta num ranking.

No surfe, a ASP criou o One Ranking como forma de dar vida a algo semelhante ao que ocorre no tênis. Quis valorizar as etapas da divisão de acesso antes chamadas de WQS - notadamente as prime, com mais dinheiro e pontuação envolvidos -, com o intuito de atrair atletas da elite. Mas para quê eles vão participar? Se o título mundial, no final das contas, é disputado apenas por quem participa das etapas do WT?

Se houvesse um ranking realmente unificado, a coisa seria diferente. Todo mundo teria chance e só participariam dos "Grand Slams da ASP" os melhores classificados.

A priori, tudo continua como sempre foi, só que se excluindo surfistas e criando a elite da elite. O ex-WCT continua no ano que vem com 22 melhores da atual temporada, mais os 10 do One Ranking, que nada mais é que o WQS de outrora, com nomenclatura mais cheia de "pra quê isso". Deu na mesma.

A ASP faz o caminho inverso da modernidade do surfe. No planeta existem mais de 32 profissionais do esporte com qualidade para disputar um circuito mundial. Cada vez mais uma elite vai ganhar mais, já que a premiação será distribuída por um número menor de competidores, enquanto outros tantos vão ficar à margem, ralando para passar a vida toda de profissional sem a mínima chance de conhecer a competição. E pior, tendo qualidade para estar ali.

O chapéu tem de ser tirado para o Brasil Surf Pro. Criou critérios de participação democráticos e que, de maneira alguma, interferiram no nível técnico do campeonato realizado em Ubatuba, este mês. Pelo contrário. Se viu mais de 60 atletas empolgados por estarem disputando um evento nacional de primeira linha e instigando outros profissionais a irem em busca do seu ingresso na competição, criando uma reação em cadeia que só beneficia o esporte.

Só fomentando o surfe em nível mundial e criando regras agregadoras pode-se empolgar os que estão começando, dizendo assim: "Você um dia pode chegar ao topo!" Fazer parte do circuito mundial, hoje, é uma tarefa inglória. Um pesadelo para quem sonhou a vida toda estar lado a lado dos melhores do mundo.

Comentários

  1. Valeu, Xandinho. Que bom que vc gostou, irmãozinho. Fico feliz. Mas isso é apenas a minha opinião. Quem tiver outras é só mandar aqui para o blog :) Abracos!

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