Teoria reflexiva



É só conversar sobre esporte de alto rendimento com especialistas, para eles, de maneira unânime, apontarem que da quantidade surge, pontualmente, a qualidade. Do crowd “chato”, entupido de gente, é que nasce o talento. Não tem jeito.

A Boa Viagem “das antigas” comprova a tese. Quando se podia surfar no Acaiaca e no Vila Rica, Pernambuco era uma potência nacional. E olhe que o potencial de BV, no que se refere a boas condições de ondas, é sofrível.

Mas os meninos aprendiam ali, aprimoravam-se mais tarde nos reefs do Estado, em Maracaípe e no Cupe, e ganhavam o mundo. Há algum tempo, depois da proibição do esporte em quase todas as praias metropolitanas, por causa dos ataques de tubarão, passamos por um período péssimo. Até que Porto de Galinhas tomou para si a responsabilidade de ser o novo criadouro.

Ora, se no Recife, com aquelas merrequinhas, formavam-se craques, imagina a prática no Litoral Sul, que recebe boas ondulações? Era o pensamento correto. O fato, no entanto, é que a galerinha de Maraca, Cupe e adjacências está no início do seu caminho. Começam a se destacar, tem talento de sobra, mas estão engatinhando no que se refere a saltos maiores.

Existe um fator determinante para a formação à conta-gota de grandes campeões locais. Temos quantidade razoável de praticantes, mas faltam os espelhos, os exemplos a seguir. A vocação pernambucana é nítida. Basta lembrar de Paulo Moura e de Bernardo Pigmeu, representantes do Estado no WCT, num passado recente.

Isso não é pouco. Na época em que Pigmeu esteve na elite mundial, a equipe brasuca era composta por sete representantes. Um de Santa Catarina, um do Rio Grande do Sul, um do Rio de Janeiro... Citei só alguns exemplos para mostrar que tínhamos "contingente" igual a outros Estados mais ricos e estruturados, inclusive no surfe.

O que falta aos meninos daqui é assistir mais sessões dos Pigs, Alans e Mouras da vida, até para instigá-los a pensar: “Esses caras surfam muito. Tenho de fazer igual!” E, assim, evoluir.

Sabe o medo? Vou dizer. Assistir à debandada da nova tropa de choque pernambucana, chamada também de "Quinteto Fantástico", formado por Halley Batista (Foto acima: Daniel Smorigo/ASP South America), Alan Donato (Foto no topo: Fábio Minduim/MaxSports), Luel Felipe, César Molusco e Júnior Lagosta.

Aos trancos e barrancos, sem que tivessem os tais grandes nomes como referência, tiveram de se virar para evoluir. Agora, chegaram a um patamar digno. Será que vão ficar? Será que vão servir de influência para as novas gerações? Espero que sim. Sei de uma coisa. Todos querem continuar por aqui. Só precisam ser reconhecidos. Pelo Estado, pelas empresas de surfwear e até pelas indústrias distantes do segmento – por que não?

O que chega a ser ridículo é observar atônito um Pigmeu da vida trocar Pernambuco por Alagoas, porque simplesmente não consegue apoio na sua terra natal. Uma luz no fim do túnel é o apoio dado pela prefeitura de Ipojuca aos seus principais profissionais.

Em conversa com Halley, recentemente, falou-me de uma empreitada com único intuito de ajudar: levar sua escolinha para outras praias daqui e ministrar clínicas de surfe. Como nutro grande simpatia por Itapoama, no Cabo de Santo Agostinho, onde pego as minhas ondinhas - aliás, na maioria das vezes são elas que me pegam –, convidei-o para dar uma chegada por lá. Mostrar ao crowd da “minha praia” como o esporte, nos dias de hoje, tem linhas modernas, performances velozes, fluídas.

Sei que um fim de semana de Halley, Alan ou Luel, em Itapoama – que tem a onda mais deitada e com menos força que a de Maraca –, ajudaria a gurizada local a entender melhor o mar no qual surfam diariamente. Seria uma ajuda e tanto. Vou retomar as conversas com o Cometa.

Enquanto vivemos este momento de instabilidade, temos a iniciativa de Geraldinho Cavalcanti com a realização do forte circuito nordestino, que chega com seu circo em várias praias do NE, a fim de agregar os bons valores da Região, além de provocar uma interação importante para o aprendizado.

Realmente espero que o surfe daqui volte a ser forte empresarialmente. Quanto mais os nossos atletas se destacarem, mais as marcas pernambucanas vão crescer – se investirem neles, é claro. Basta ver o incentivo das etiquetas cearenses nos seus. E como os nossos conterrâneos deram um salto no mercado.

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