Quarto Escuro





Ruclécio Lucena, shaper pernambucano dos bons, estava realmente louco para voltar ao Peru. Dessa vez para pegar as "bombas". No dia 16 de agosto, partiu. E, nesta quarta-feira, mandou o seu primeiro relato da trip ao "País das Ondas Perfeitas". A história narrada por Ruclécio faz a adrenalina ser despejada violentamente no corpo. Parece que o leitor está dropando a onda junto. Levando a vaca ao seu lado. Mas vale a pena conhecer o "quarto escuro". Pode ter certeza. Nem que seja à frente de um computador. A seco. Sim! O pontinho preto nesta onda acima, de 22 pés, em Pico Alto, é ele :)

Foto: Gizele

16 de agosto
Ao chegar no aeroporto do Recife lembrava da ansiedade que tomou conta de mim durante a semana. Era uma das maiores que já senti, pois havia monitorado um swell muito grande que poderia chegar em Pico Alto, no Peru. Algo que nunca tinha visto pessoalmente. Apostava em 22 pés. E não me sentia preparado. O aumento de encomendas de pranchas nos últimos tempos não me deu tempo para uma preparação adequada. A adrenalina fazia parte de cada momento.

Ao chegarmos em Lima, capital do Peru, o primeiro estresse: nossa bagagem, precisamente a prancha de Gizele, parecia ter sido extraviada. Após duas horas prestando queixa no balcão da TAM, demos endereço e contatos de onde ficaríamos. Pasmem, às 22h - horário local - entregaram a nossa prancha! No entanto, tínhamos um quiver no Luisfer Surfcamp, de três pranchas, que deixamos três meses atrás. Isso, de certa forma, nos tranqüilizava um pouco. No final das contas, o contratempo nos tirou um dia de surfe.

Dia seguinte fomos para Punta Rocas, com uma transformer 6'3''. Um paulista que havíamos conhecido tinha nos dito que havia 4 a 5 pés de onda no dia anterior. Chegando lá, o mar quebrava com 8 a 9 pés, formação linda, mas pesada como de costume. Resultado: fizemos boas sessions não registradas.

No mesmo dia, Luisfer perguntou se queria cair em Pico Alto. E, com a afirmativa, fomos no dia seguinte: eu, seu filho Luisito e o mestre das grandes ondas. Fizemos boas ondas com séries de 15 a 17 pés. Como de costume Luisito, um jovem com espírito de guerreiro, desafiou as ondas com a leitura que herdou de seu pai. O mestre Luisfer, mesmo machucado, mostrava sua maestria em curvas explosivas e fechadas no lugar mais crítico das maiores ondas. Eu, num momento sublime, consegui entubar em uma onda que me parecia ter 17 pés. Luisito, que estava no canal, me disse: "Ruclécio, he visto todo, si tuviese una camara... El tubo fue buenaso”. Senti ter tirado sorte grande, apesar da pouca experiência.

Ao anoitecer, soube que haveria um campeonato de ondas gigante na remada em Pico
Alto no dia seguinte. O Billabong Pico Alto Invitational 2010 contou com a presença do pernambucano Carlos Burle, Greg Long, Ramon Navarro e outros de renome no cenário mundial, vindos de lugares como EUA, África do Sul, Hawaii, México, entre tantos outros países.

Nesta noite, o Luisfer vaticinou: "O mar vai estar gigante. Falam em 30 pés para amanhã. Se formos as 5:45 da manhã faremos tow-in até as 9h. Se quiser ir...". Mais uma vez confirmei ao amigo que estava ali para isso. Não consegui dormir tamanha era a expectativa.

No dia seguinte vi ondas de 28 pés e foram registradas ondas minhas que acredito ter em torno de 22 pés. Durante a competição, Carlos Burle afirmou ter pego uma onda de 30 pés na remada. Mais uma vez me impressionou a audácia de Luisito, assim como de Guilhermo, campeão do ultimo campeonato de tow-in em Ufos Point.

Porém, nem tudo foram flores. Em uma das minhas ondas tive o desprazer de conhecer o tão comentado quarto escuro de Pico Alto. Passei muito tempo em baixo d’água e ao retornar não pude ser resgatado. Atrás veio uma onda de uns 25 pés e só deu tempo para respirar o suficiente para não desmaiar. Nesse momento conheci o tal quarto.

Ao retornar à superfície devido ao colete salva-vidas que usamos para ajudar na subida de um caldo, vi o Mestre Luisfer e o campeão Guilhermo com olhos arregalados e gritando "estais bien, Ruclécio?", enquanto seu filho Lusito me resgatava gritando "rápido Ruclécio, bora, bora!" Olhei para todos e os tranqüilizei, dando um uivo e falando "conheci o tal quarto!". E todos voltaram a ter o semblante que deveriam. As imagens que fizemos serão lembranças impagáveis.

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