Pico Alto em frente e verso

Ruclécio Lucena, shaper e big rider pernambucano, conta um pouco sobre o poder de Pico Alto, no Peru. Em agosto, o local de Enseada dos Corais, no Cabo de Santo Agostinho (PE), provou das doses cavalares do lugar, que havia seis anos não dava o ar da graça. Teve a disposição de colocar para baixo em morras de mais de 20 pés. O herói conta, num texto claro e cheio de emoção, como é o surfe em Pico Alto. Ótimo para quem quer se aventurar na temida onda.

O kamicase Paulo Câmara na vaca que custou a prancha. Foto: Ruclécio

Luisito tomando na cabeça. Foto: Ruclécio

Dia 20 de agosto foi épico. Após ter pego duas vezes Pico Alto de tow-in, lembrando que faz seis anos que o mar de lá não quebra em condições extremas, segundo as autoridades do surfe local, acordei com forte dores por todo o corpo – principalmente nas pernas e nas costas. Era o sinal do despreparo físico. Logo depois, fui dar uma olhada no mar sem pretensões. E vi 10 a 12 pés “plástico”. O mar não parava de quebrar. Assisti a sessões de amigos com pranchas de 9' a 9'6'' pés (Marcos Monteiro, que fez final no Billabong Invictacional, e os big riders Patrick e Ylan, do Rio de Janeiro, encontravam segurança com essas medidas). Parecem pranchas grandes, mas para aquele mar não é. Essa era a condição ideal para pegar as ondas. Só um grande amigo, que jura não ser kamicase, entrou com uma 8'4'', que partiu após um caldo numa intermediária. Antes de entrar, alguns riders indagaram: "donde vais com esta tabla?". Seu nome é Paulo Câmara, um paulista atirado, que freqüenta essas ondas há um bom tempo. Mais tarde, Ylan nos falou: “Vaquei numa da série e atingi o reef, que fica a mais de 6 m de profundidade no inicio da onda”. Ele nos mostrou seu pé machucado, mais uma experiência para o já tão experiente rider

Mark Healey conhecendo os salões de Pico Alto. Foto: Flávio Sinkus

Quando falo de Pico Alto, quem nunca foi ali não tem a noção do que é aquela onda. É larga como nunca vi, chegando a ser confundida, por trás, como uma simples ondulação. No entanto, seu tubo é um devorador de coragem. É mais forte do que jamais imaginei. Falam que se trata de uma das mais fortes do mundo. Pode estragar a viagem de qualquer um, segundo minha amiga Flávia, esposa de mestre Luisfer. “Ruclécio, és todo psicológico, non hai problemas”. Pela primeira vez, discordei de Flávia, a quem tenho muito respeito. Como vários big riders que conheci, ela entende como poucos de ondas de todo tipo. Mas, para mim, Pico Alto é uma onda que não permite erros. Em caso de vacilo, no mínimo você terá uma péssima recordação. Sterling, campeão do Billabong Invictacional 2010, saiu de uma das ondas vomitando após um caldo monumental, sendo resgatado pelo mestre Luisfer, na hora certa, com a precisão de um ocean rider team, equipe sul-americana de big riders tow-in, que dava suporte aos atletas com resgate de jet-ski.

Marcos Monteiro mostrando habilidade numa bomba. Foto: Flávio Sinkus

À noite jantávamos quando o Marcos Monteiro sentou ao nosso lado. Gizele, muito curiosa, perguntou: “O que se passa na sua cabeça quando se dropa uma onda daquela na remada?”. Após alguns segundos de silêncio, ele respondeu com a humildade e respeito: “Eu penso em terminar a onda me mantendo vivo”. Suas sabias palavras eram ditas sem intenção de valorizar o que faz. Mas sim com a consciência dos riscos e de quem faz aquilo por puro amor à adrenalina, que toma o nosso corpo nas atividades extremas. Este é o tipo de atitude que você tem de ter por você. A partir do momento que é feito pelo ego, os riscos aumentam substancialmente e as conseqüências podem ser trágicas.

A partir de 12 pés, as ondas de Pico Alto, no início, fazem um barulho de uma pancada seca, lembrando uma colisão de carros. Logo após, o som é de uma avalanche ou terremoto. Trata-se de uma onda oceânica. Nunca tinha ouvido ou visto algo semelhante até cair lá, salientando que fica a mais ou menos 1 km da praia. Com correntes e pedras que brotam do nada na saída. E nesse percurso de remada, além de varias arrebentações ocasionais, a baía pode fechar quando passa dos 17 pés, tornando entrada e saída do mar mais dois desafios.

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